quinta-feira, 4 de abril de 2013

RHOMEDES - Diretamente de Santiago, Chile


Uma célebre Casablanca distante do Marrocos

Menos tradicional que o Valle do Maipo, no Chile, o Valle de Casablanca começou sua produção de vinhos em 1982 e vem crescendo rapidamente desde então. São mais de cinco mil hectares de plantações nos arredores da Ruta 68, estrada que vai de Santiago à região costeira de Viña del Mar e Valparaíso. Hoje é considerado o melhor lugar do país para a produção de vinhos brancos, principalmente o Sauvignon Blanc e o Chardonnay. Entre os tintos destacam-se o Pinot Noir e o Syrah, particularmente adaptados à influência marítima que traz uma névoa matinal do Oceano Pacífico atuante como moderador de temperatura. Além disso, as tardes frescas que caracterizam a região dos vales interiores chilenos favorecem a maturação adequada das uvas e a produção de vinhos tintos de clima frio.
Foi em um passeio durante a Semana Santa que um grupo de amigos do Rio de Janeiro, em visita à House Casa Del Vino, descobriu esse paraíso enoturístico de grande beleza. Depois do tour personalizado e didático, do contato com as diferentes cepas, de folhas coloridas com formas e tamanhos variados, de conhecerem o peculiar sistema de enxertos, de comprovarem a distinta doçura das uvas, de recordarem que o Cabernet Sauvignon é o filho polinizado do Cabernet Franc com o Sauvignon Blanc, o grupo foi afinal apresentado ao exclusivo Tiraziš, um vinho de elaboração manual que expressa sua origem de forma inigualável. 
Na língua elamita, Tiraziš significa Shyraz, o nome de uma cidade no antigo reino da Pérsia onde se acredita que a cepa teve origem. Em algumas partes do mundo, o Syrah é conhecido como Shyraz. Segundo a tradição, no palácio real dessa cidade histórica, onde habitava o soberano Djemchid junto ao seu harém, um jarrão com uvas foi esquecido pelos que manuseavam os víveres. Depois de algum tempo, um servente palaciano o encontrou e dentro dele identificou um líquido nebuloso, borbulhante e de odor desconhecido. Intrigado, pendurou no recipiente de barro um aviso com a palavra "veneno" e o guardou. Uma das esposas do rei, que se encontrava muito deprimida, um dia decidiu suicidar-se. Encontrou casualmente o tal "veneno" na dispensa e o ingeriu. Começou então a sentir um bem-estar inexplicável e correu feliz de volta ao palácio, cantando e dançando. O soberano ouviu falar na transformação inexplicável da concubina e consultou a corte sobre o ocorrido. Ao saber da origem da euforia, o rei bebeu entusiasmado a mesma poção desconhecida e experimentou os mesmos efeitos. Decretou por fim que aquelas uvas cultivadas fossem guardadas tal como se fizera naquele jarro de barro original, passando o apreciado licor a ser parte das mais caras tradições persas. Considera-se, inclusive, que se de fato algum vinho foi tomado na Última Ceia, tratava-se provavelmente de um Tiraziš, muito típico na região do Oriente Médio.
O Tiraziš do Valle de Casablanca, de produção limitada, é essencialmente um Syrah de clima frio, oriundo do campo Belém, situado no setor de Lo Ovalle (que possui apenas 130 hectares de plantação), no qual a Viña Morandé (Grupo Belén) introduziu em 2010 essa cepa singular, em menos de quatro hectares adicionais sobre as ladeiras do Cerro Algarrobo. As especialíssimas características daquele microclima permitiram que a planta explorasse o solo fértil, sob as sombras naturais e praticamente sem trabalhos agrícolas, garantindo ao produto um nível de acidez que lhe favorece a estocagem por vários anos. No nariz, destacam-se com preponderância as especiarias, a pimenta branca, os pimentões e as frutas silvestres negras. Na boca, revela-se a intensidade da textura e da estrutura do vinho, ao mesmo tempo fino e potente. Serve de complemento tanto às carnes fortes quanto aos peixes com mais gordura, que vão muito bem com cepas tintas de clima frio. Seu consumo é recomendado a uma temperatura de 16°C.



Além do trabalho admirável do enólogo Sven Bruchfeld, pai do Tiraziš, foi possível ao grupo conhecer também a criatividade de Luis Piano, responsável pelo porta-fólio do Grupo Belén e, em especial, pela identificação visual desse verdadeiro clássico chileno. No rótulo revela-se toda a premiada criatividade de Piano, numa espécie de storyboard ou sucessão de imagens ilustrativas que resgata cada um dos elementos envolvidos na produção de um vinho feito a mão, um verdadeiro vinho de autor.

                                                                             



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